A JUVENTUDE PIEDOSA
Como pode o jovem ter uma vida limpa e pura? Vigiando os seus passos conforme a tua palavra. (Sl 119.9, Bíblia Viva)
A pergunta desta estrofe, ainda que retórica, põe em evidência um dos maiores problemas práticos da vida: como (ou com o que) viver uma vida irrepreensível? Ou, nas palavras de Spurgeon: “como (o jovem) poderá conquistar o certo e conservar o certo?”[1]. Não precisa dizer que quem escreve essas palavras é possivelmente um velho. Como professor de sabedoria, o sábio está preocupado com a instrução dos jovens. A falta de experiência é notória nessa idade. Eis aí a razão porque o sábio diz ao filho ou discípulo (ver Pv 1:4; 25:12-13; Ec 11:9; 12:1), que ele pode manter-se “puro” - equivalente a “irrepreensível” (v. 1) e “firme” (v. 5) - pela prática da piedade[2].
“Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”, não tem lugar aqui. Por sua experiência, o professor sabe que obedecer à vontade revelada de Deus é o único caminho para qualquer membro da comunidade da aliança viver irrepreensivelmente. Assim, a grande pergunta, a que vem antes de todas, que o jovem piedoso deve se propor não é sobre com quem vai se casar, ou que faculdade vai cursar, ou se será bem sucedido profissionalmente. Todas essas perguntas são válidas e importantes. Entretanto, na aurora da vida, a pergunta mais importante é aquela que afetará também seu ocaso: como viver de modo irrepreensível?
A pergunta é importante, e suscita outras tantas perguntas igualmente importantes e complexas. Elifaz e Bildade, dois amigos de Jó, lhe fizeram as seguintes perguntas, respectivamente: "Como o homem pode ser puro? Como pode ser justo quem nasce de mulher? Como pode então o homem ser justo diante de Deus? Como pode ser puro quem nasce de mulher?” (Jó 15:14; 25:4, NVI). Para piorar, Salomão dispara à queima roupa a seguinte indagação: “Quem poderá dizer: ‘Purifiquei o coração; estou livre do meu pecado?’" (Pv 20:9, NVI). Esses versículos são cristalinos no seu diagnóstico do estado moral e espiritual do homem: diante de Deus e comparada com Deus, toda a humanidade permanece manchada e suja.
No entanto, apesar de flagrante situação, Isaías exorta as pessoas a se purificarem: “As vossas mãos estão cheias de sangue: lavai-vos, purificai-vos! Tirai da minha vista as vossas más ações! Cessai de praticar o mal, aprendei a fazer o bem! Buscai o direito, corrigi o opressor! Fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva!” (Is 1:15a-17). “Mesmo se não pudermos nos tornar absolutamente puros, somos responsáveis por nos purificar do tipo de imundície que Isaías descreve. A impossibilidade da perfeição sem pecado não nos desculpa de levar a sério as exigências de Deus”[3].
As perguntas parecem convergir para a resposta do sábio: “vigiando os seus passos conforme a tua palavra”. A implicação é que o jovem manter-se-á puro à medida que comparar, controlar, vigiar, observar sua conduta de acordo com a palavra do Senhor. O conselho de Spurgeon[4] ainda é válido: “querido jovem, que a Bíblia seja seu mapa, e que você exerça grande vigilância para que seu caminho se amolde a suas diretrizes”.
Antes de encerrar destacamos o termo "Palavra" (dābār), que ocorre vinte e quatro vezes neste salmo. Seu significado básico é o de que qualquer palavra que proceda da boca do Senhor é dābār. É uma designação mais geral para a revelação divina, seja do ponto de vista da expectativa ou da promessa[5]. Da expectativa, porque se espera dos membros da aliança que vivam pelo mandamento do Senhor. Da promessa, porque se sabe que eles falham em cumprir o seu dever, por isso, a promessa é que Deus os ajudará graciosamente a fazê-lo.
À luz da Nova Aliança, a pergunta de Elifaz e Bildade só encontrou uma resposta satisfatória na cruz de Cristo. Como pode ser justo quem nasce de mulher? A resposta de Paulo é que só Deus pode nos justificar. Sabemos que pela obediência à lei o homem não alcançou a justiça de Deus (Rm 7). Quanto mais tentava obedecer à lei, tanto mais ficava evidente o abismo que o separava do elevado padrão de Deus. Desse modo, somente quando confiamos inteiramente em Cristo Jesus para a nossa salvação é que entendemos que “o homem é justificado pela fé, independente da obediência à lei” (Rom 3:21-28, NVI). Não foi o que fizemos que forçou Deus a nos declarar justo, mas o que Cristo fez por nós e em nosso lugar. O único homem justo que nasceu de mulher foi Cristo. A razão é que somente um homem puro poderia satisfazer as exigências da justiça de Deus. Como pode ser justo quem nasce de mulher? Crendo em Cristo, a nossa propiciação.
Querido jovem, em Cristo Jesus você tem uma nova vida. O fato de não sermos justificados diante de Deus pela lei, não nos exime de obedecer a Palavra de Deus. Não a obedecemos com a expectativa de sermos perfeitos ou salvos. Como já dissemos isso nos é impossível. Obedecemos porque amamos a Deus. Na caminhada haverá muitos percalços e até fracassos. Mas não desista. Siga em frente. A boa nova do evangelho é que Deus proveu um meio para nos purificar: o sangue de Jesus (1 Jo 1.7-10, NVI). Siga sempre a orientação da Palavra de Deus e você terá uma vida limpa e pura. Que Deus o ajude.
Jânio da Cunha Bastos
[1] SPURGEON, C. H. Salmo 119: o alfabeto de ouro. Trad. Valer Graciano Martins. São Paulo: Edições Parakletos, 2001. p. 26.
[2] VANGEMEREN, Willem A. The expositor’s Bible commentary: Psalms. Michigan: Zondervan, 2008.
[3] GOLDINGAY, John. Baker commentary on the Old Testament: wisdom and psalms. Michigan: Baker Academic, 2013.
[4] Idem, p. 27.
[5] VANGEMEREN, 2008.
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