quinta-feira, 24 de outubro de 2019

COMO ERAM AS MANIFESTAÇÕES DO ESPÍRITO SANTO NO ANTIGO E NO NOVO TESTAMENTO?


O Evangelho de João relata uma passagem da vida de Jesus que leva algumas pessoas a entender que o Espírito Santo não agia entre o povo de Deus antes da vinda de Cristo. Diz o texto:

No último dia, o mais importante da festa, Jesus se levantou e disse em alta voz: “Quem tem sede, venha a mim e beba! Pois as Escrituras declaram: ‘Rios de água viva brotarão do interior de quem crer em mim’”. Quando ele falou de “água viva”, estava se referindo ao Espírito que seria dado mais tarde a todos que nele cressem. Naquela ocasião o Espírito ainda não tinha sido dado, pois Jesus ainda não havia sido glorificado.

João 7.37-39

Nessa passagem, Jesus estava se referindo à vinda do Espírito Santo no dia de Pentecostes, em cumprimento às promessas da antiga aliança. Os profetas haviam avisado que o Messias inauguraria seu reino acompanhado do Espírito Santo, com paz e prosperidade. Segundo as profecias, era o Messias quem haveria de conceder o Espírito Santo.

Portanto, a referência que Jesus faz nessa passagem não é tanto ao que acontece individualmente, mas à sequência histórica, até porque o texto nos revela que Jesus seria glorificado e, depois, o Espírito Santo viria. Ora, Jesus já estava glorificado! Afinal, ele era o Filho de Deus! Assim, a referência é ao momento histórico em que Jesus ressuscita, sobe aos céus e é exaltado à direita de Deus.

O evento histórico seguinte é o derramamento do Espírito Santo sobre a Igreja. Logo, a referência é à história da salvação e não à ordem da salvação individual. Consequentemente, esse versículo não pode ser usado para dizer que antes da glorificação de Jesus o Espírito Santo não habitava nas pessoas. O que ocorria é que ele ainda não viera, oficialmente, a fim de capacitar a Igreja a cumprir a missão de evangelizar o mundo.

Precisamos reconhecer que esse entendimento não é unanimidade entre os teólogos; há polêmicas a respeito. Existem, basicamente, duas posições: primeiro, há quem defenda que, na época do Antigo Testamento, o Espírito Santo não habitava nos salvos. Assim, pessoas como Abraão, Isaque, Jacó, os profetas, os juízes, os libertadores de Israel e os homens piedosos entre os israelitas não seriam habitação do Espírito Santo. Os defensores dessa linha creem que o Espírito Santo agia neles e por meio deles, mas não morava neles de forma permanente.

Entre os textos que os adeptos dessa interpretação costumam usar para embasar sua posição estão, além da passagem de João 7.37-39, o episódio em que Saul profetizou e “o Espírito de Deus veio poderosamente” sobre ele (1Sm 10.10), e as palavras do rei Davi, que, ao pecar e se arrepender, orou: “Não me expulses de tua presença e não retires de mim teu Santo Espírito” (Sl 51.11). Então, os adeptos dessa linha teorizam que o Espírito Santo podia entrar e sair das pessoas sem habitar permanentemente nelas. Logo, por esse pensamento, as pessoas tinham fé, eram salvas e iam para o céu, mas o Espírito Santo não habitava nelas.

Entendo que, por algumas razões, esse pensamento é falacioso. Primeiro, é impossível uma pessoa crer, se converter e ser regenerada sem que haja uma operação do Espírito Santo em seu coração. Mais que isso, é impossível ela se manter nesse estado a menos que o Espírito Santo a preserve nessa situação, o que significa que é impossível alguém se converter e permanecer temente e fiel a Deus sem que o Espírito Santo lhe dê assistência constante, fazendo-o perseverar, dando-lhe ânimo, convencendo-o de seus pecados, encorajando-o, guiando seu entendimento e mortificando o pecado em seu coração.

Em outras palavras, as pessoas se convertiam no Antigo Testamento da mesma forma que se convertem atualmente. A obra de salvação efetuada pelo Espírito Santo no Antigo Testamento é análoga à feita hoje: ele convencia do pecado e regenerava o pecador, que, então, expressava sua fé em Deus mediante os sacrifícios no templo.

Para não deixar dúvidas, preciso explicar as passagens mencionadas anteriormente, a respeito de Saul e Davi.

O fato de que o Espírito Santo veio sobre Saul e ele foi usado por Deus não quer dizer que Saul era regenerado. O Espírito Santo vinha sobre pessoas, fossem elas salvas ou não. Temos de fazer uma distinção entre a habitação do Espírito Santo em nosso coração e a sua vinda sobre nós como capacitação. Assim, Saul, que sabemos não ter sido um crente verdadeiro, foi usado pelo Espírito Santo, porque Deus usa quem quer. Lembremos que ele usou Judas com sinais, prodígios e maravilhas e o capacitou a expelir demônios, embora aquele homem não fosse regenerado. Podemos entender o mesmo de Saul.

Já as palavras de Davi no salmo 51 não se referem à presença salvadora do Espírito Santo no seu coração, mas à unção do Espírito Santo para que ele fosse rei, líder do povo de Deus. Ele não queria perder essa unção — é a isso que ele se refere.

Ainda no Antigo Testamento, podemos nos lembrar de João Batista, afinal, ele foi um profeta do período da antiga aliança, embora sua história seja relatada no Novo Testamento, uma vez que viveu antes de Pentecostes. A Bíblia diz que João Batista foi cheio do Espírito Santo já no ventre da sua mãe.

Outro episódio significativo é o diálogo entre Jesus e seus discípulos, quando o Senhor vai lavar os pés de Pedro e o pescador se recusa a aceitar esse gesto. É quando Jesus lhe diz: “A pessoa que tomou banho completo só precisa lavar os pés para ficar totalmente limpa. E vocês estão limpos” (Jo 13.10). Com essas palavras, Cristo deixa claro que aqueles homens já eram convertidos. Logo, o que aconteceu no dia de Pentecostes foi a vinda do Espírito Santo a fim de capacitar os cristãos a cumprir aquilo que Jesus havia dito e não para habitar em indivíduos em quem não habitava antes.

Jesus disse aos discípulos: “Vão ao mundo inteiro e anunciem as boas-novas a todos” (Mc 16.15) e “Vocês receberão poder quando o Espírito Santo descer sobre vocês, e serão minhas testemunhas em toda parte: em Jerusalém, em toda a Judeia, em Samaria e nos lugares mais distantes da terra” (At 1.8). Portanto, o Pentecostes foi o momento em que o Espírito Santo veio com poder e plenitude sobre a Igreja, para capacitá-la a exercer a sua missão. Fica claro que o Espírito Santo salvou na época do Antigo Testamento da mesma forma que salva na época do Novo. Mas, claro, há uma diferença.

No Novo Testamento, na nova aliança iniciada no dia de Pentecostes, todo cristão recebe a capacitação do Espírito Santo, por meio de diferentes dons. Antes, o Espírito Santo vinha sobre reis, sacerdotes, juízes e profetas a fim de capacitá-los, mas não sobre todo o povo. Essa é, portanto, a diferença do Antigo para o Novo Testamento no que se refere ao Espírito Santo. É uma distinção quantitativa e não qualitativa.


Fonte: NICODEMUS, Augustus. Cristianismo facilitado: respostas simples para questões complexas. São Paulo: Mundo Cristão, 2019. [recurso eletrônico]

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