terça-feira, 28 de julho de 2015

Como lidar com nossos próprios fracassos espirituais?


Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo, para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o justo.
E ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo. 1 João 2:1,2

Como lidar com nossos próprios fracassos espirituais? Ou, se você quiser, o que fazer quando pecamos? Pergunta difícil. Objeto de acalorados debates e discussões por parte dos doutores da teologia, abordada em páginas e páginas de rebuscadas argumentações. Leia, caro leitor, uma obra de história do pensamento cristão para tirar suas conclusões. A intenção deste texto é menos pretensiosa, gostaria apenas de mostrar o que João nos diz sobre esse assunto na sua primeira epístola, mas especificamente em I Jo 2.1,2. 

Como aconteceu em quase todas as cartas do Novo Testamento, uma heresia (ou várias) estava ameaçando os crentes, provavelmente da Ásia (LOPES, 2004, p. 11). A heresia era uma espécie de proto-gnosticismo, que enfatizava que o espírito é totalmente bom e a matéria totalmente má - dualismo. Além disso, ensinavam que a salvação se dá por meio de um conhecimento esotérico – a gnose – que somente os iniciados possuem. 

As consequências para o cristianismo são obvias. Para a teologia, a negação da plena encarnação e divindade de Jesus, que é visto como um fantasma - docetismo -, pois como a matéria é má Ele não poderia ter um corpo de carne e osso. Para a ortopraxia, o ascetismo e o antinomianismo. Como João dá maior ênfase ao antinomianismo que está sendo ensinado pelos falsos mestres, darei uma breve explicação sobre ele. Em linhas gerais, o antinomianismo significa uma vida sem lei ou regras (LOPES, 2004). Aplicado ao contexto da Epístola, seria dizer que o cristão é livre para fazer o que quiser, que pode dar vasão aos seus instintos mais baixos, pois, onde abundou o pecado, superabundou a graça. Como o corpo é mal, nada do que fazemos por meio dele afeta a alma ou prejudica nossa comunhão com Deus. “O que o corpo faz, a alma perdoa”, como diz a música. João, portanto, fornece alguns critérios para que os irmãos pudessem avaliar a validade dessas doutrinas e viver em verdadeira comunhão com Deus.

Gostaria de destacar que a provisão do Pai para o cristão que peca está em Seu Filho, que possui tríplice qualificação (STOTT, 1982): 

Em primeiro lugar, Sua advocacia celestial. Como ensina Stott (1982, p. 69), a palavra advogado (lat. advocatus e gr. paraklêtos), significa “chamado ao lado de”, e descreve alguém convocado para assistência a outrem. Lopes (2004, p. 47) diz que “aplicada a Cristo, a idéia é que ele fala sobre nós com o Pai, em nossa defesa, e intercede para que sejamos perdoados (Rm 8.34; l Tm 2.5; Hb 7.24,25)”. Embora a comparação remeta-nos à imagem do tribunal, João nos lembra de que a nossa “defesa” não é perante um juiz, mas de um pai. Isso porque a nossa relação com Deus mudou, fomos justificados por Cristo, nenhuma condenação há para aqueles que estão Nele. Portanto, quando Cristo intercede por nós no céu quando pecamos não é a satisfação da justiça que é visada, mas o perdão para o filho que errou (STOTT, 1982). 

Em segundo lugar, Seu caráter justo. Cristo é perfeito, não conheceu pecado. Sua vida foi imaculada, impoluta. Por isso “é mais que evidente que somente por meio de um Salvador justo poderíamos ser purificados “de toda injustiça” (1:9). Cf. 2 Co 5:21 e 1 Pe 3:18” (1982, p. 71).

Sua morte propiciatória. Propiciação é uma palavra tirada da liturgia dos sacrifícios levíticos do Antigo Testamento. Assim como o animal morto nestas cerimonias representava o “pagamento” pelo pecado do transgressor da lei – a alma que pecar, essa morrerá -, o apaziguamento da ira de Deus e sua reconciliação com Ele, da mesma forma a morte de Cristo para o cristão representa substituição, perdão e reconciliação. Como diz Stott (1982, p. 73) “Ele não poderia ser nosso Advogado no céu hoje, se não tivesse morrido para ser a propiciação pelos nossos pecados; e a Sua propiciação não teria sido eficaz, se em Sua vida e caráter não tivesse sido Jesus Cristo, o justo”.

Caro irmão, fuja da autoindulgência, a provisão de Deus não deve nos encorajar ao pecado, mas fuja também da severidade exagerada consigo, recusando a provisão de Deus para sua vida. “Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo, para que não pequeis”, essa é a intenção de João para as suas ovelhas – e também a de Jesus, quando disse à mulher pecadora “vai e não peques mais” -, mas sabemos que acidentes acontecem e para essas circunstancias é que João nos lembra que temos Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo.


Referências Bibliográficas

STOTT, John. As epístolas de João: introdução e comentário. São Paulo: Edições Vida Nova e Editora Mundo Cristão, 1982. 

LOPES, Augustus Nicodemus. Interpretando o Novo Testamento: primeira carta de João. São Paulo: Cultura Cristã, 2004.

As bíblias citadas foram consultadas no site: www.bibliaonline.com.br. Acesso em: 28 jul 2015.

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